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“octo _ _ _ _”, de Pedro Tudela e Miguel Carvalhais

A proposta de designação por parte dos autores, “instalação ambiental”, reflete a sua sensibilidade à incessante mutação da paisagem sonora e visual e traduz o seu caráter material, imaterial e inclusivo, integrando a componente tecnológica à corpórea. Implementada na zona próxima ao Forte de São João Baptista de Esposende, integra-se no Parque Natural Litoral Norte, localizando-se na área exterior ao perímetro de proteção definido pela Direção Geral do Património Cultural no respetivo processo de classificação. À paisagem da referida área associa-se um ecossistema único, caracterizado por uma elevada diversidade de fauna e flora. A área reúne características diversas que albergam 240 espécies de plantas em 15 distintos habitats, incluindo quatro considerados prioritários. O estuário do Rio Cávado, a título de exemplo, acolhe diferentes espécies como o junco e a arméria, habitado maioritariamente no período migratórios e invernos rigorosos. Constitui proteção e fonte de alimento à fauna ictiológica, com destaque para a lampreia e enguia. Este habitat reúne o maior número de espécies consideradas prioritárias para a Conservação da Natureza.

Inaugurada a 5 de setembro de 2019, octo_ _ _ _ proporciona três distintas leituras: a um primeiro momento observativo – distante e enquadrado na paisagem que une mar e rio – segue-se uma aproximação interativa, em contacto direto com paisagem e edificado. Implementada entre o natural e o construído, a obra de arte transfigura e é transfigurada pela sonoridade e luminosidade que a rodeiam. O último estado de perceção ocorre na possibilidade do contacto físico com a peça, em harmonia e respeito pelos habitats e com eles, em processos de constante mutação, apropriando-se dos seus múltiplos elementos naturais. O desafio colocado aos artistas inclui, para além do património natural, a interpretação do património classificado, gerando uma leitura que interseta o desenho do Forte de São João Baptista de Esposende. Nas palavras da curadora, Helena Mendes Pereira, “a disposição dos módulos procura uma relação de cruzamento de geometrias com os vértices e os ângulos da fortificação, afrontando-a na sua função de defesa, por um lado, e, por outro, elogiando-lhe as singularidades fazendo dela derivar uma nova presença corpórea na paisagem.” Conjuga a visão da região minhota como área produtiva, mas ressalva o enquadramento paisagístico e natural único que caracteriza o território do concelho de Esposende.

Através de uma instalação composta por oito módulos de ferro pintados a negro (zona exterior) e vermelho (no interior), com o formato de “L” e generosas dimensões (150 cm x 150 cm) são dispostos em cenário de múltiplas contemplações: do Forte, da via, do passadiço. De acordo com os artistas Pedro Tudela e Miguel Carvalhais, “cada módulo terá uma presença física — matéria, volume, cor, densidade, luz, temperatura — mas também uma presença sonora — emanando som, radiando uma aura sonora que o envolverá como uma pele ou um casulo”. O primeiro diálogo é entre a obra de arte e a natureza, que a apropria e por ela é apropriada; entre a solidez do material e a fluidez do cenário envolvente; entre o artificial da solução tecnológica que garante o seu funcionamento e a sustentabilidade da solução, em sintonia com os eixos do projeto global no qual surge. De forma ininterrupta, som e luz são instalados de forma a que a atenção se centre na peça e suavemente ativados. Uma coluna sonora e iluminação LED são, aqui, marca distintiva do potencial do processo de transformação smart city. Adaptam-se, respetivamente, à atividade diária do espaço particular, complementada por iluminação automática, ativada no intervalo do sol através da sensorização. No futuro, alimentar-se-á dele. À semelhança de Esposende SmartCity, ecoam a dinâmica particular do espaço e das suas pessoas.

Em sintonia com a linha de pensamento do projeto global a partir da qual foi criada, não se encerra em si própria – caracteriza-se por uma gradual transformação. Às suas características de perceção imediata – materiais ou cromáticas - soma-se um processo de coexistência com o biodiversidade, o património e o referencial humano. O diálogo com octo _ _ _ _não é de sentido único. Embora incalculável, a experiência estética mede-se pelo ponto de partida, a longevidade do contacto, o ritmo da interação, o percurso criado e o número de vezes a que a ela regressamos. Cada encontro é irrepetível e redesenhado de forma contínua pela luminosidade, hora do dia e condições atmosféricas. A fusão dos diferentes módulos ocorre não apenas entre si, mas do conjunto em relação à paisagem onde se insere, incorporando as componentes sonora e visual. Na sua futura localização será autossuficiente, ponto alto do princípio da sustentabilidade transversal do projeto, em particular e ao compromisso global do Município: transformar Esposende em uma das primeiras cidades inteligentes do país.

Fotografias da sessão de inauguração

Sobre os artistas

Pedro Tudela (n.1962) é artista visual e sonoro e professor auxiliar no departamento de Artes Plásticas da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. Trabalha em cenografia desde 2003. Expõe com regularidade em Portugal e no estrangeiro desde 1981. Encontra-se representado em museus, coleções públicas e particulares, sendo considerado um dos mais proeminentes artistas da sua geração. Miguel Carvalhais (n.1974) é designer e músico, professor auxiliar no departamento de Design da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto e investigador no INESC TEC. A música foi um dos lugares de encontro entre os dois que, a partir de 2000, fundam o projeto transdisciplinar @c e em 2003 a editora Crónica, que publica música experimental e eletrónica. São autores de mais de 20 álbuns, de difusão nacional e internacional e já se apresentaram ao vivo em alguns dos principais palcos em Portugal e além-fronteiras, colaborando frequentemente com outros músicos artistas. Da música, a parceria artística entre Pedro Tudela e Miguel Carvalhais rapidamente expandiu para a domínio da instalação, em que o som é a base para o desenvolvimento de projetos site specific multimédia que divagam para contextos de ativações sensoriais complexas dos públicos e que, necessariamente, se vinculam aos ambientes de implementação, estabelecendo com eles uma relação de interdependência, no exercício complexo, completo e delicado de lhes serem pertença, ainda que apenas obra de arte na magnânima condição do belo, da vanguarda e da vertigem.